"PS de Coimbra está virado para o umbigo"
Carlos Cidade candidata-se à Concelhia do PS de Coimbra acenando ao eleitorado com trabalho e novos métodos. E contra os biombos.
Até que ponto esta é uma candidatura de ruptura com o passado na Concelhia de Coimbra do PS?
Eu diria que esta candidatura nasceu da necessidade de credibilizar o PS em Coimbra. Há razões, que são sobejamente conhecidas, que levaram um grupo de militantes a encarar uma candidatura que fosse de mudança. De ruptura, em relação a métodos de trabalho, porque o Partido Socialista tem uma declaração de princípios que todos devemos respeitar; mas os métodos de trabalho que queremos implementar são naturalmente diferenciados da direcção que está a terminar o seu mandato na Comissão Política Concelhia de Coimbra.
Não será mais uma mudança de pessoas?
É evidente que os métodos são aplicáveis por pessoas. E naturalmente são as pessoas que têm as ideias para concretizar esses métodos de trabalho. E um grupo de militantes reconheceu em mim a capacidade de dedicação, de trabalho e, também, de mérito político para poder encabeçar uma lista ganhadora.
Fala-se em unidade e coesão mas há duas candidaturas…
Não tenho dúvidas de que quando entendemos avançar para esta candidatura uma das grandes preocupações foi a unidade do partido. Aliás, eu comecei este processo nos finais de 2007, tive a preocupação de falar com todos os responsáveis do PS, quer a nível interno, quer a nível de órgãos do Estado que têm essa responsabilidade. Sempre com a perspectiva de unidade. E todos conhecem a forma transparente como tenho evoluído neste processo e os passos que foram dados. Tivemos muitas conversas, aliás o meu camarada Henrique Fernandes foi um dos primeiros que contactei. Ele sabe perfeitamente os objectivos desta candidatura, como disse no discurso de apresentação: eu quero um PS forte, coeso e unido. Um PS com uma profunda exigência, exigência que eu coloco a mim próprio e à equipa que me vai acompanhar na próxima Comissão Política Concelhia.
Fala com confiança… até onde vai a determinação de Carlos Cidade?
A determinação já está confirmada pelo apoio à nossa candidatura de centenas de militantes do concelho de Coimbra, pelo trabalho que desde Outubro tenho vindo a desenvolver junto dos militantes. Eu tenho ouvido as estruturas do partido, tenho ouvido a sociedade civil. Há um espaço, neste momento, em que esta candidatura é transversal às várias sensibilidades que existem dentro do PS de Coimbra. Portanto, estão todas as situações criadas para haver uma vitória de uma nova equipa no PS local.
Voltando às mudanças de métodos no PS, o que teria de mudar no imediato?
A primeira acção que teremos na próxima concelhia é ter uma preocupação: a marca, a imagem do PS tem de ser preservada a todo o custo. E isso vai ter o meu empenhamento e não vai haver a possibilidade de, seja quem for, poder beliscar a imagem e a marca do PS, que tem de ser prestigiada. Por outro lado, temos propostas de trabalho com as secções um pouco diferentes daquelas que têm sido utilizadas. Nós queremos as secções a trabalhar no pleno, com os objectivos do PS nas várias localidades, e que, localmente, as pessoas se revejam nas secções, reconhecendo que têm ali pessoas cuja prática política dá confiança no futuro. Queremos abrir o PS à sociedade civil, e à comunidade, onde temos instituições de excelência; o PS, hoje, está virado para o umbigo, entre aspas; hoje, está-se no poder, dentro do PS, só por estar. Nós vimos de várias derrotas eleitorais e queremos alterar este percurso, e para isso só tendo um PS a falar permanentemente com a cidade, com a comunidade. Não é o que tem acontecido apesar de alguns focos, ali ou acolá, pontuais, que se concretizam. Mas isso não chega, é preciso ir muito mais além.
A imagem beliscada de que falou está relacionada directamente com a questão Luís Vilar?
Eu não quero comentar as questões pessoais do meu camarada Luís Vilar. Aliás, desejo sinceramente, e ele sabe disso, que tudo isto não passe de um equívoco. Agora, é evidente que a pessoa Luís Vilar não pode ser desligada do cargo político que tem, e nesse sentido deveria ter sido preservada a imagem do PS. Hoje, o PS está ferido, em termos de imagem, perante a comunidade. As pessoas têm de ter a capacidade e grandeza suficiente para perceberem isso e não pôr em causa o PS.
O actual presidente, que não o apoia, disse que não patrocinaria quem pensasse numa gestão de "cátedra" da concelhia ...
Quem me conhece sabe que sou um homem de trabalho. Sou um homem de grande dedicação, muito empenhado, e o meu compromisso vai ser com os militantes, com quem falaremos permanentemente. Prevemos que uma das grandes medidas que têm de ser tomadas -temos responsabilidades acrescidas porque o PS vai ser confrontado com três actos eleitorais muito importantes - será passar por todas as secções e freguesias no sentido de começar a ouvir os militantes. E não é só ouvi-los, é levá-los a participar nas decisões, é eles sentirem que podem dar um contributo decisivo, nomeadamente para a escolha dos candidatos. Vou pedir a todos os militantes nas secções que dêem a sua opinião, que ajudem o PS a ter os melhores candidatos para ganhar as eleições autárquicas, quer ao nível das juntas de freguesia, quer ao nível da câmara. As pessoas, os militantes, têm de tornar a sentir que são, cada um deles, um ponto de referência na decisão política que os órgãos devem tomar.
Sendo assim, nada está decidido, não há ainda um perfil do candidato à câmara?
Não podia haver. Mas nesta campanha há essa preocupação, pois temos, acima de tudo, de transmitir e divulgar um método de trabalho que vai ser concretizado, e que passa por ouvir todos os militantes. Até Outubro de 2008 proponho-me realizar uma convenção autárquica aberta, para ouvir todas as secções e debater os perfis que melhor se adaptem à candidatura do PS - à câmara e às juntas de freguesia - e que correspondam também aos anseios de uma cidade moderna, que queremos que Coimbra passe a ser.
Como entende a entrada em cena de Henrique Fernandes?
O camarada Henrique Fernandes foi dos primeiros a saber da minha intenção e eu fui dos primeiros a saber que ele nunca teria intenção de ser candidato a presidente da concelhia. Estamos a falar de Outubro de 2007. Acho estranho que as coisas se tenham precipitado no sentido de haver duas listas, mas também quero dizer o seguinte: o PS - e por isso é que todos nos sentimos bem no PS - é um partido livre, responsável, em que a unidade se constrói na diversidade; e nesse sentido nós estamos disponíveis para consensos.
Que consensos?
Consensos que o próprio camarada Henrique Fernandes sabe quais são, porque conversámos várias vezes sobre esse assunto. Ele deveria ter ficado acima desta pugna eleitoral. A nossa candidatura não tem biombos, é aberta, eu sou candidato a presidente da concelhia mas todos se podem ver. Não há qualquer biombo. A candidatura do camarada Henrique Fernandes parece que tem um biombo atrás. Parece que há aqui qualquer coisa que não bate certo. Ele sabe que é possível chegar a consensos, nós estamos abertos a esses consensos e ele conhece a nossa posição.
Esses biombos são pessoas, coisas, têm nome?
Não tenho dúvidas de que atrás do biombo há algumas pessoas que claramente estão a comandar a candidatura do camarada Henrique Fernandes.
Será salutar à sociedade ter um líder partidário a acumular funções de governador civil?
Eu sempre defendi que os partidos são os pilares da democracia. E o PS, partido do poder, deve exercê-lo na sua plenitude. Agora, deve também saber distinguir aquilo que é do partido e aquilo que é do Estado. Aliás, é uma orientação que o secretário-geral, engenheiro José Sócrates, colocou às estruturas do partido no início do mandato como primeiro-ministro. Eu recordo que o senhor governador civil de Leiria - hoje não é porque passou para o Governo - era presidente de federação e de uma outra estrutura do PS e teve de abandonar para exercer o cargo de governador civil de Leiria. Apesar de não haver incompatibilidade no plano prático, há incompatibilidade no plano político. Ao Estado o que é do Estado, ao partido o que é do partido.O camarada Henrique Fernandes, que eu prezo muito, tem feito um trabalho intocável à frente do Governo Civil, nem se compreende porque vem a uma luta eleitoral interna quando não havia necessidade. Nós temos os nossos objectivos definidos, ele conhece-os, e há compaginação clara nessa matéria. Portanto, creio que é um mau serviço que se pode prestar ao PS e um pior serviço do que tem feito se mantiver as duas situações. Mas como eu creio que quem vai ganhar a concelhia somos nós, o camarada Henrique Fernandes vai continuar a exercer bem o mandato de governador civil de Coimbra sem ter preocupações no plano partidário.
Como a concelhia terá uma palavra a dizer, que imagem tem da actual câmara de Coimbra?
A actual câmara municipal falhou claramente. O PS vai ter a grande responsabilidade de recuperar a câmara. E vai ter de falar verdade às pessoas sobre a situação financeira da câmara, que é muito preocupante. Não direi que está no colapso mas se outros não tomarem as rédeas do município a situação será de uma grande gravidade. Há outras preocupações. No centro histórico, na Baixa, foram tomadas pontualmente algumas iniciativas mas é o anda e o faz que anda. Quando se colocar a questão das autárquicas apresentaremos propostas de soluções, com alguma coragem, mas que correspondem a uma visão moderna da cidade. E teremos de criar condições de investimento, infra-estruturas, mas sem penalizar os investidores com preços astronómicos de terrenos. Não lhes dando condições envenenadas, que é o está a acontecer com o Coimbra iParque. Que é uma grande iniciativa, mas tem de chamar os investidores, quer de Coimbra, quer de fora, com condições favoráveis.
Contar com todos para credibilizar a Câmara
O PS vai ter de recuperar a credibilidade da câmara municipal no todo nacional. E para isso teremos de contar com todas as instituições da cidade, universidade, institutos, hospitais e empresas, algumas que são, de facto, referências nacionais e internacionais. Não lhes podemos virar as costas. Temos condições de resolver este tipo de problemas, mas primeiro precisamos de um PS coeso e unido.
Diário de Coimbra - 03-03-2008
António Manuel Rodrigues